Consumidor poderá evitar surpresas na conta de luz com rede inteligente
Rodrigo Dionisio/Folhapress | ||
Acervo do Museu da Lâmpada, em São Paulo |
Uma revolução está para acontecer no sistema elétrico brasileiro. Na geração, ela será dada por uma participação maior de fontes alternativas. Na distribuição, o "smart grid", ou as redes inteligentes de energia, promete dar robustez a todo o sistema.
Segundo Wilson Ferreira Jr., presidente do grupo CPFL Energia, astecnologias estão prontas para serem implantadas e os consumidores em breve se beneficiarão delas.
No entanto, a queda das tarifas de energia, que dispararam neste ano, não está próxima. A novidade, diz Ferreira Jr. à Folha, é que o consumidorpoderá gerenciar o seu consumo, evitando tomar um susto quando a conta chegar.
Folha - Um dos grandes focos de investimentos no Brasil são projetos de geração a partir de fontes renováveis. Essa corrida é sustentável?
Wilson Ferreira Jr. - É preciso diferenciar o que são fontes renováveis do que, no Brasil, chamamos de alternativas. Nossa matriz energética sempre comportou um percentual muito grande de hidrelétricas, que, embora sejam renováveis, não ganham o caráter sustentável que o mundo dá às gerações eólica e solar. Por aqui, chamamos de fontes alternativas, para justamente dar esse caráter de menor impacto ambiental.
Existirá um dia em que as pessoas darão preferência a produtos "green energy" (energia verde), o que ajudará o país a explorar o que sempre foi uma marca, sua grande matriz energética sustentável. Sempre tivemos um potencial hidrelétrico muito grande e, agora, temos também potenciais eólico e solar, além da biomassa da cana.
Os investimentos em eólicas dispararam nos últimos anos. Não há limites para isso?
Por enquanto, estamos longe desse limite. No caso das eólicas, o potencial brasileiro é de 350 mil MW (megawatt) e temos apenas 5,9 mil MW em operação. Se juntarmos tudo o que já tem instalado No Brasil –hidrelétricas, termelétricas, eólicas, solares –, soma 130 mil MW. Ou seja, apenas o potencial das eólicas é o triplo de tudo o que já construímos. E isso é só onshore (em terra). Não estamos falando do potencial de parques eólicos no mar.
Outro potencial extraordinário é a geração solar, com capacidade para produzir até 118 mil MW. Temos 35 MW instalados. Estamos muito longe ainda.
O investimento em energia solar ainda engatinha. Por quê?
Porque, diferentemente das eólicas, que já trabalham com eficiência de 50%, a conversão de luz em eletricidade é menor que 20%. O custo dessa fonte ainda é alto. O que desenvolveu as eólicas foram os leilões, preços competitivos, financiamentos facilitados. Somente agora estão fazendo isso com a solar. Esses tipos de fontes alternativas carecem de escala.
Entrar tarde no desenvolvimento dessas fontes não coloca o país abaixo no quesito geração de tecnologia?
Não perdemos o timing da tecnologia. Quando se participa de um leilão e se financia a construção da usina pelo BNDES, o banco exige um conteúdo nacional de 65%. Isso transformou o Brasil em um polo de produção de equipamentos. Já temos tecnologia para atender o mercado nacional e o latino-americano.
Na questão da distribuição de energia, o "smart grid" caminha lentamente. Quando a tecnologia estará disponível?
O "smart grid" é uma revolução em relação ao atendimento ao consumidor, mas talvez haja uma má compreensão do que ele é de fato. Há 20 anos, fui aos EUA avaliar como eles faziam a medição do consumo à distância. Aqui, até hoje, um "leiturista" vai mensalmente à casa do consumidor. Mas na CPFL, em toda sua área de concessão, os clientes da alta tensão (grandes comércios e indústrias) são todos "telemedidos". Não vai mais um leiturista nessa fábrica ou comércio. Fazemos a medição e a fatura vai por e-mail após 1,2 segundo. Já são 700 mil contas enviadas por e-mail.
Mas será essa a revolução do "smart grid"? Enviar contas por e-mail?
O principal desafio do "smart grid" era transitar dados pela rede de distribuição. Instalamos postos repetidores de sinal em uma rede neural. Quando há a interrupção em determinado ponto, nosso sistema reconfigura automaticamente a distribuição de energia.
Esse tipo de tecnologia também permite a avaliação de fraudes ou furtos, diminui significativamente as interrupções do sistema, além de fornecer ao consumidor a capacidade de medir seu consumo de forma informatizada. Nos EUA, como o custo de produção de energia varia constantemente, inclusive durante o dia, o "smart grid" permite ao usuário gerenciar seu consumo, aproveitando momentos de energia mais barata. No Brasil, isso não acontece, mas a complexidade dos nossos sistemas vai aumentar, o que exigirá do consumidor esse gerenciamento.
Quando o sistema ficará disponível para o consumidor se proteger das tarifas?
Agora vamos implantar 2 milhões de medidores para aqueles consumidores que mostraram interesse em fazer essa gestão da energia. A tecnologia já está pronta, só falta aplicá-la. Então esse negócio de projeto piloto, P&D (pesquisa e desenvolvimento), não existe mais nada para fazer. O que era para estudar, já estudamos.
Mas é preciso entender que o sistema brasileiro é composto por duas tarifas e temos responsabilidade apenas sobre uma, sobre a qual a Aneel, em todas as revisões de ciclos tarifários, reviu para baixo [a outra é composta por impostos, encargos e pelo custo da geração]. A única coisa que contribuiu para a modicidade tarifária foi oTRABALHO das distribuidoras.
Hoje, com tarifas tão altas, o setor já está se reequilibrando a ponto delas voltaram a baixar ou as tarifas altas vieram para ficar?
Houve uma confluência de problemas. Foi uma coincidência infeliz a publicação da medida provisória 579, em 2012, e a crise hidrológica. Tínhamos uns seis problemas no sistema e cinco já foram endereçados, como a crise hidrológica. Infelizmente, quem tem que assumir o custo do sistema é quem se beneficia do consumo. O que chamo de realismo tarifário é isso. Enquanto nossa geração está mais cara, o consumidor paga mais caro. Entre 2013 e 2014, o Tesouro Nacional poupou esse consumidor de um custo próximo de R$ 30 bilhões. Não à toa, o consumo este ano diminuiu quando o usuário começou a pagá-lo. Hesitou-se em colocar o realismo tarifário, mas por causa dele, não haverá racionamento, pois todos se viram responsáveis.
O realismo blinda o setor?
Sim, mas blinda os consumidores também. O realismo exige que os consumidores e as empresas do setor sejam mais eficientes.
RAIO-X
WILSON FERREIRA JR
Formação Graduado em Engenharia elétrica e administração pela Universidade Mackenzie
CARREIRA Presidente da CPFL e presidente do Conselho da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib)
Segundo Wilson Ferreira Jr., presidente do grupo CPFL Energia, astecnologias estão prontas para serem implantadas e os consumidores em breve se beneficiarão delas.
No entanto, a queda das tarifas de energia, que dispararam neste ano, não está próxima. A novidade, diz Ferreira Jr. à Folha, é que o consumidorpoderá gerenciar o seu consumo, evitando tomar um susto quando a conta chegar.
Folha - Um dos grandes focos de investimentos no Brasil são projetos de geração a partir de fontes renováveis. Essa corrida é sustentável?
Wilson Ferreira Jr. - É preciso diferenciar o que são fontes renováveis do que, no Brasil, chamamos de alternativas. Nossa matriz energética sempre comportou um percentual muito grande de hidrelétricas, que, embora sejam renováveis, não ganham o caráter sustentável que o mundo dá às gerações eólica e solar. Por aqui, chamamos de fontes alternativas, para justamente dar esse caráter de menor impacto ambiental.
Existirá um dia em que as pessoas darão preferência a produtos "green energy" (energia verde), o que ajudará o país a explorar o que sempre foi uma marca, sua grande matriz energética sustentável. Sempre tivemos um potencial hidrelétrico muito grande e, agora, temos também potenciais eólico e solar, além da biomassa da cana.
Os investimentos em eólicas dispararam nos últimos anos. Não há limites para isso?
Por enquanto, estamos longe desse limite. No caso das eólicas, o potencial brasileiro é de 350 mil MW (megawatt) e temos apenas 5,9 mil MW em operação. Se juntarmos tudo o que já tem instalado No Brasil –hidrelétricas, termelétricas, eólicas, solares –, soma 130 mil MW. Ou seja, apenas o potencial das eólicas é o triplo de tudo o que já construímos. E isso é só onshore (em terra). Não estamos falando do potencial de parques eólicos no mar.
Outro potencial extraordinário é a geração solar, com capacidade para produzir até 118 mil MW. Temos 35 MW instalados. Estamos muito longe ainda.
O investimento em energia solar ainda engatinha. Por quê?
Porque, diferentemente das eólicas, que já trabalham com eficiência de 50%, a conversão de luz em eletricidade é menor que 20%. O custo dessa fonte ainda é alto. O que desenvolveu as eólicas foram os leilões, preços competitivos, financiamentos facilitados. Somente agora estão fazendo isso com a solar. Esses tipos de fontes alternativas carecem de escala.
Entrar tarde no desenvolvimento dessas fontes não coloca o país abaixo no quesito geração de tecnologia?
Não perdemos o timing da tecnologia. Quando se participa de um leilão e se financia a construção da usina pelo BNDES, o banco exige um conteúdo nacional de 65%. Isso transformou o Brasil em um polo de produção de equipamentos. Já temos tecnologia para atender o mercado nacional e o latino-americano.
Na questão da distribuição de energia, o "smart grid" caminha lentamente. Quando a tecnologia estará disponível?
O "smart grid" é uma revolução em relação ao atendimento ao consumidor, mas talvez haja uma má compreensão do que ele é de fato. Há 20 anos, fui aos EUA avaliar como eles faziam a medição do consumo à distância. Aqui, até hoje, um "leiturista" vai mensalmente à casa do consumidor. Mas na CPFL, em toda sua área de concessão, os clientes da alta tensão (grandes comércios e indústrias) são todos "telemedidos". Não vai mais um leiturista nessa fábrica ou comércio. Fazemos a medição e a fatura vai por e-mail após 1,2 segundo. Já são 700 mil contas enviadas por e-mail.
Mas será essa a revolução do "smart grid"? Enviar contas por e-mail?
O principal desafio do "smart grid" era transitar dados pela rede de distribuição. Instalamos postos repetidores de sinal em uma rede neural. Quando há a interrupção em determinado ponto, nosso sistema reconfigura automaticamente a distribuição de energia.
Esse tipo de tecnologia também permite a avaliação de fraudes ou furtos, diminui significativamente as interrupções do sistema, além de fornecer ao consumidor a capacidade de medir seu consumo de forma informatizada. Nos EUA, como o custo de produção de energia varia constantemente, inclusive durante o dia, o "smart grid" permite ao usuário gerenciar seu consumo, aproveitando momentos de energia mais barata. No Brasil, isso não acontece, mas a complexidade dos nossos sistemas vai aumentar, o que exigirá do consumidor esse gerenciamento.
Quando o sistema ficará disponível para o consumidor se proteger das tarifas?
Agora vamos implantar 2 milhões de medidores para aqueles consumidores que mostraram interesse em fazer essa gestão da energia. A tecnologia já está pronta, só falta aplicá-la. Então esse negócio de projeto piloto, P&D (pesquisa e desenvolvimento), não existe mais nada para fazer. O que era para estudar, já estudamos.
Mas é preciso entender que o sistema brasileiro é composto por duas tarifas e temos responsabilidade apenas sobre uma, sobre a qual a Aneel, em todas as revisões de ciclos tarifários, reviu para baixo [a outra é composta por impostos, encargos e pelo custo da geração]. A única coisa que contribuiu para a modicidade tarifária foi oTRABALHO das distribuidoras.
Hoje, com tarifas tão altas, o setor já está se reequilibrando a ponto delas voltaram a baixar ou as tarifas altas vieram para ficar?
Houve uma confluência de problemas. Foi uma coincidência infeliz a publicação da medida provisória 579, em 2012, e a crise hidrológica. Tínhamos uns seis problemas no sistema e cinco já foram endereçados, como a crise hidrológica. Infelizmente, quem tem que assumir o custo do sistema é quem se beneficia do consumo. O que chamo de realismo tarifário é isso. Enquanto nossa geração está mais cara, o consumidor paga mais caro. Entre 2013 e 2014, o Tesouro Nacional poupou esse consumidor de um custo próximo de R$ 30 bilhões. Não à toa, o consumo este ano diminuiu quando o usuário começou a pagá-lo. Hesitou-se em colocar o realismo tarifário, mas por causa dele, não haverá racionamento, pois todos se viram responsáveis.
O realismo blinda o setor?
Sim, mas blinda os consumidores também. O realismo exige que os consumidores e as empresas do setor sejam mais eficientes.
RAIO-X
WILSON FERREIRA JR
Formação Graduado em Engenharia elétrica e administração pela Universidade Mackenzie
CARREIRA Presidente da CPFL e presidente do Conselho da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib)