sábado, 10 de janeiro de 2015

Léa Maria Aarão Reis
Divulgação/Caliban
O fascinante novo filme de um dos mais respeitados documentaristas brasileiros, Silvio Tendler – Privatizações: a distopia do capital – relembra e esclarece, em uma aula cinematográfica de 59 minutos de grande impacto, como se deu o processo do crescente desmonte do estado brasileiro pelas mãos dos governos neoliberais dos dois fernandos do passado, começando em Collor e atingindo o seu ápice com FHC.

Sob o patrocínio do ideário do saudoso geógrafo Milton Santos, Tendler, diretor e roteirista do filme, avisa no prólogo que vai tratar não apenas do processo de privatizações do qual o Brasil e sua população foram vítimas, mas também “das artimanhas do capital internacional em aliança com os capitais nacionais contra a nossa economia.”

Nada mais oportuno. Assistir, divulgar e exibir este doc seguido de debate político, em especial nesses próximos dez dias, nas escolas de nível médio e salas de aula do ensino superior, cineclubes, no circuito cultural, nas lajes e nas diversas atuais novas plataformas disponíveis de cinema. Um dos objetivos: desconstruir o mantra decorado pelo candidato da direita Aécio Cunha à presidência da república, que promete, nas linhas e entrelinhas de seu programa de governo, encenar o derradeiro ato do triste teatro do desmonte do estado brasileiro. Isto se por acaso fosse eleito.



O mesmo candidato que, sempre leve como se estivesse nas areias da praia do Leblon, e com a ligeireza que lhe é peculiar, se refere em vazios pronunciamentos às severas críticas dessa história sinistra das privatizações no país - ativos públicos vendidos ou ofertados quase de presente ao setor privado - como sendo a “demonização” das esquerdas a esse processo criminoso.

Privatizações: a distopia do capital mostra o ônus que pagamos hoje decorrente das políticas de desestatização. Oferece uma aula dinâmica, com ritmo notável, sobre a história recente do Brasil através das entrevistas de intelectuais, políticos, economistas, técnicos e educadores de prestígio: Carlos Lessa, Márcio Pochmann, Samuel Pinheiro Guimarães, João Pedro Stédile, Guilherme Estrella, Ermínia Maricato, Luiz Pinguelli, Carlos Vainer, Paulo Vivacqua, Marcos Dantas, Maria Inês Dolci, Ladislau Dowbor, Vagner Freitas, Eduardo Fagman, Henri Acserald, Souza Bravo, Gaudêncio Frigotto e Pablo Gentili. Eles traçam, partindo da era Vargas, o percurso dos sentimentos e momentos dramáticos da vida nacional relacionados às privatizações.

A realização do filme é do Sindicato dos Engenheiros no Estado do Rio de Janeiro (Senge/RJ) e da Federação Interestadual de Sindicatos de Engenheiros (Fisenge) com o apoio da CUT Nacional; a produção é da Caliban. Resultado de ampla pesquisa de entidades de classe, os engenheiros, na apresentação do trabalho, declaram: “O filme é movido pelo permanente combate à perda da soberania em espaços estratégicos da economia. O movimento sindical tem a clareza de que o processo de privatizações da década de 90 é a negação das premissas do projeto de desenvolvimento que sempre defendemos”.

Eduardo Fagnani (Unicamp) resume o processo que violou o Brasil nos anos 90: “Deu-se a vingança da Economia sobre a Política que passou a refletir o interesse do capital.” Os economistas que na ocasião resistiam às diretrizes econômicas eram chamados, no governo de FHC, de dinossauros, lembra o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães. “E a mídia teve responsabilidade nesse processo, pelos seus vínculos com os grandes interesses multinacionais hoje aqui instalados.”

Já Stédile vai direto ao ponto e fulmina: ”O povo brasileiro perdeu o controle sobre suas principais riquezas. Quando se tentou mudar o nome da Petrobrás para Petrobrax o argumento era o de que os gringos podiam pronunciar mais facilmente o X. Por aí se vê o nível da mediocridade da nossa burguesia subalterna da qual o Fernando Henrique Cardoso é o principal porta-voz e representante.”




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